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27.06.2012

Afinal, por que se tratar com plantas medicinais?

As plantas medicinais são muito mais indicadas para tratamentos preventivos, ou em situações simples ou iniciais de doença. Quando se utiliza fitocomplexos, obtém-se padrões de resposta muito mais próximos aos fisiológicos. É por isso que os efeitos colaterais são muito menos frequentes, a aceitabilidade é melhor e problemas como dependência e tolerância não costumam ocorrer. E ainda tem a vantagem que os produtos naturais possuem um impacto ambiental imensamente menor que os químicos. Deve ser por isso que a fitoterapia voltou a crescer em todo mundo, de forma vigorosa esustentável. Os fitocomplexos estão presentes nas plantas e são grupos de substâncias quimicamente relacionadas. A seguir, você terá acesso a informações resumidas desde a origem da fitoterapia até o desenvolvimento atual.

Origens

O uso medicinal de plantas é um aspecto tão antigo na cultura humana, quanto a própria espécie. As plantas podem ser identificadas como principais armas terapêuticas de nossa espécie, em todas as civilizações, todos os grupos etno-sociais, todos os continentes, desde que a história pode ser mapeada de forma mais detalhada pela arqueologia. Até o início do século XX, as plantas eram a principal fonte dos medicamentos usados no mundo. É um dos traços mais universais e trans-culturais da espécie humana. Evidências, em espécimes humanos preservados, em utensílios de argila, ou ainda em escavações, do uso frequente de plantas, com até 60 mil anos de idade, já estão registrados na literatura científica. Mas alguns pesquisadores estimam que é provável que o emprego medicinal das plantas seja tão antigo, que transcenda nossa espécie, já sendo um artifício de sobrevivência utilizado por outros hominídeos.

A interação entre animais e vegetais é muito complexa e muito antiga, e pode envolver aspectos adaptativos que ainda não estão completamente estudados e elucidados. Por exemplo, uma proporção significativa das plantas de comportamento ruderal (aquelas que ocupam as áreas onde o homem se instala e destrói a vegetação nativa) tem uso medicinal. Essa coincidência sugere que um dos caminhos adaptativos que essas plantas encontraram para competir nesse ambiente, foi a de oferecer um benefício medicinal ao homem, e dessa forma serem poupadas ou mesmo estimuladas a se desenvolver ali.

As relações de interação entre animais e vegetais são muito antigas, no processo evolutivo da vida na Terra. Exemplos de simbiose quase tão antigos quanto os animais, como a incorporação de baterias na forma de mitocôndrias em células animais, pode ser entendida como um dos pilares do processo evolutivo das espécies no planeta. Troca de fragmentos de DNA e outras interações podem explicar avanços evolutivos que a ciência encontra dificuldade de compreender. O fato é que há evidências crescentes de uma grande interação entre espécies animais em vegetais em cada nicho ecológico, de forma tão visceral, que a quebra dessas interações pode até comprometer a sobrevivência das espécies. Ou seja, não existe espécie animal que não tenha interações e graus de dependências das outras espécies vegetais. Por exemplo, gorilas africanos ingerem quantidades significativas da espécie Aframomum melegueta uma zinziberácea que previne shiguelose e endomiocardiofibrose, dois problemas frequentes nesses primatas. Se plantas podem oferecer sua diversidade química como fonte de substâncias ativas, o papel dos animais na dispersão de sementes e ocupação de regiões propícias ao crescimento, para os vegetais, é indiscutível. Os benefícios de saúde gerados por muitas plantas medicinais podem, então, ser entendidos dentro dessa relação simbiótica que se formou e continua se formando nos ecossistemas terrestres.

Literatura antiga apresenta ricas informações sobre plantas

Vários autores que publicaram nos últimos anos sobre plantas medicinais chamam a atenção para a riqueza da literatura antiga sobre plantas medicinais, incluindo citações no papiro Ebers (1550 aC), em textos babilônicos, nos Vedas – livros sagrados do indianos, na famosa Matéria Médica do Marido Divino (Shen Nong Bem Cao –220 aC) e até na Bíblia. Não podemos esquecer da importância dessas referências. Por meio delas podemos identificar as espécies com maior potencial medicinal, e quais suas principais possíveis indicações, ajudando na orientação e estudos científicos. Daí nasceu uma ciência chamada etnofarmacologia, que investiga o uso popular e antigo das plantas, traduzindo isso para uma base de conhecimento científica que permita o aproveitamento dessa informação.

Os diferentes grupos humanos, com suas peculiaridades culturo-sociais, vem recorrendo às espécies vegetais predominantes em seus ecossistemas, e foram construindo um vasto arsenal de espécies medicinais, ao longo de milhares de anos, e que chegaram até nós graças ao processo cultural de acúmulo e transmissão de conhecimento. Mais e mais espécies têm sido reportadas e cadastradas em diversos estudos etnobotânicos e etnofarmacológicos feitos em todos continentes, nas mais variadas condições de clima, relevo e composição de solo, resultando num número muito significativo de potenciais plantas para uso medicinal. Infelizmente, apenas uma pequena minoria dessas espécies, foi investigada com suficiente profundidade para dar suporte ao seu uso terapêutico nos sistemas de saúde modernos.

Inúmeras espécies medicinais

Existem estimativas sobre o número de espécies medicinais descritas, mas os números são especulativos. Publicações chinesas descrevem cerca de 8.500 espécies. Uma ONG que trabalha com conservação de espécies estima em 15.000 o número de plantas de emprego medicinal, em uso corrente. Existem aqueles que usam o número de espécies vegetais estimadas na biodiversidade mundial – cerca de 250 mil, e avaliam que5 a10% têm potencial medicinal, chegando a um universo de 20 mil vegetais. Autores como Ameh citam 50 mil espécies em seu recente levantamento (2010). Qualquer que seja a referência, sabemos que é um enorme universo, que a maioria das espécies ainda não foi suficientemente estudada, e que há um enorme campo de trabalho pela frente.

Fitoterapia pelo mundo

Outro fato relevante é que, apesar da haver uma pequena valorização dos fitoterápicos pela medicina, seja no universo acadêmico, seja no receituário médico, há uma forte tendência mundial, na sociedade, de buscá-los para tratamento e bem estar. Em muitos países do primeiro mundo, são outros profissionais de saúde (nutricionistas, terapeutas, enfermeiros), e não os médicos, que prescrevem os medicamentos fitoterápicos. A Alemanha é o país onde há o maior número de prescrições médicas de fitoterápicos. Já nos Estados Unidos sua venda é livre na internet ou em lojas de produtos naturais, havendo muita automedicação. Os autores Hoareau & DaSilva avaliam que cerca de 1.500 fitoterápicos possuem um bom nível de informação e qualidade na produção dos extratos, permitindo sua comercialização em países do primeiro mundo.

Existem evidências indiscutíveis desse aumento. Uma é o crescimento no número de publicações em periódicos indexados. No ano de 1998 cerca de mil publicações citaram a palavra fitoterapia. Em 2007 esse número havia superado a casa de 15 mil publicações, ou seja, foi dobrando a cada dois anos – uma curva exponencial. Os valores apurados no mercado de fitoterápicos reforçam esse fantástico aumento de sua penetração na sociedade do século XXI. Em 1999 o mercado mundial de fitoterápicos foi estimado e 19 bilhões de dólares, concentrado na Europa, EUA e Ásia. Em 2004 esse valor havia praticamente dobrado, com participações crescentes de África e América Latina, e incremento dos volumes comercializados e exportados em todos mercados.

Laboratório natural

É bom lembrar que plantas são fixas no solo, e não possuem muitos dos sistemas e vantagens adaptativas dos animais, como circulação sanguínea e sistema imune. Toda a adaptação das plantas para lidar com estresse, seja físico (metereológico), químico ou biológico, é feito através da síntese de substâncias químicas. Por isso, toda planta é um laboratório químico de grande eficiência. Cada espécie é capaz de sintetizar mais de 300 substâncias diferentes, com uma enorme diversidade de funções biológicas. É esse motivo que as fazem ser a fonte de uma quantidade enorme de novas substâncias e de estruturas com arquitetura química inovadora, que tem permitido o desenvolvimento de fármacos e outros produtos químicos.

Ou seja, plantas ainda são a principal reserva de novos produtos químicos que poderão ser colocados a serviço do homem, com um enorme potencial, em inúmeras áreas. Entretanto, o problema é que substâncias que ocorrem naturalmente, não podem ser patenteadas. Então a estratégia da indústria farmacêutica, e outros ramos da indústria química é copiar moléculas vegetais, modificando-as, e criando moléculas novas, e essas sim são patenteadas e comercializadas. A indústria farmacêutica alega que seus produtos são melhores, porque ao modificar as moléculas quimicamente, em geral, aumentam sua potência ou sua permanência no organismo. A questão é que os sistemas adaptativos vivos, sejam animais ou vegetais, usam pouco a estratégia de sistemas lineares de causa e efeito. Em geral as respostas adaptativas são multifatoriais, envolvendo dezenas de mediadores e receptores, com funções diferentes, e a resposta biológica vem da resultante dessa interação complexa.

Fitocomplexos

As plantas possuem os fitocomplexos, que são grupos de substâncias quimicamente relacionadas, que visam obter respostas adaptativas complexas e multifatoriais, como as que eu relatei. Um fitocomplexo pode ter até 30 ou 40 substâncias diferentes, interagindo entre si. Quando usamos uma planta medicinal, pegamos emprestado do vegetal sua sabedoria química, desenvolvida através de anos e evolução, e que serve como sistema adaptativo também para um organismo animal. A interação química complexa dos sistemas adaptativos está ainda acima da capacidade de processamento de dados dos nossos modelos de estudo aplicados em biologia e medicina. Isso de forma nenhuma impede seu uso, e deveria ser um motivo para sua desqualificação, como tem sido feito de forma repetida pela medicina e pelos setores conservadores da academia.

 

Alex Botsaris é médico formado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, autor de livros como: “O Complexo de Atlas”, “Sem Anestesia” e “Fórmulas Mágicas“ e “O Prazer de Se Cuidar” . Acaba de lançar “Medicina Ecológica”. Consultor da Pierre Alexander Cosméticos.